Quem somos

24 de mar. de 2010

Tudo no tempo certo MESMO.

B. não era um amigo íntimo, mas a gente curtia a companhia um do outro, e cada vez que eu o via voltava para casa com uma renovada admiração por sua firmeza e calma interior. B. não era desses que ficam se lamuriando e sentem pena de si mesmos. Por mais sombrias que as coisas andassem para seu lado nos anos recentes (intermináveis problemas com dinheiro, falta de sucesso artístico, ameaças de despejo do seu senhorio, problemas com a ex mulher), nada disso parecia tirá-lo do rumo. Continuava a pintar com a mesma paixão de sempre e, ao contrário de tantos outros, nunca manifestava a menor amargura ou inveja em relação a artistas menos talentosos e que estavam se saindo melhor do que ele.


B. era extremamente alto (um e noventa ou um e noventa e cinco), tinha boa aparência e maneiras gentis - qualidades que o tornavam especialmente atraente para as mulheres. Assim que seu divórcio ficou para trás e ele voltou a circular, não teve dificuldade para encontrar companhia feminina. Eu só o via cerca de duas ou três vezes por ano, mas a cada vez havia uma nova mulher na sua vida. Todas estavam visivelmente doidas por ele. Bastava ver o jeito como olhavam B. e logo percebíamos como elas se sentiam, mas por alguma razão nenhum daqueles casos durou muito tempo.


... B. se mudou para fora da cidade e perdemos contato. Passaram alguns anos e então certa noite, B. voltou a cidade e quando ficamos sabendo que B. estava prestes a se casar, pedimos que contasse a história de como havia conhecido a sua futura esposa.


Um seis meses antes, disse B., ele estava conversando com um amigo por telefone. Esse amigo estava preocupado com B. e, depois de um tempo, começou a repreende-lo por não ter casado de novo. Já faz sete anos que você se divorciou, disse seu amigo, e nesse tempo você poderia ter se casado com qualquer uma das muitas mulheres bonitas e bacanas com quem saiu. Mas nenhuma é boa o suficiente para você e você acaba se desfazendo de todas elas. Qual é o problema com você? O que é que você quer, afinal?


Não há nenhum problema comigo disse B. Eu só não encontrei a pessoa certa, só isso.

E do jeito que está levando as coisas, não vai encontrar nunca, respondeu o amigo. Quer dizer, alguma vez já encontrou uma mulher que pelo menos se aproximasse do que está procurando? Diga o nome de uma só. Desafio você a dizer o nome de uma.


Espantado com a veemência do amigo, B. fez uma pausa afim de refletir cuidadosamente sobre a pergunta. Sim, respondeu afinal, houve uma. Seu nome era E., ele a conheceu quando era estudante na Universidade de Harvard, mais de vinte anos antes. Mas na época ela estava envolvida com outro homem, e ele estava envolvido com outra mulher (sua futura ex esposa), e nada aconteceu entre os dois. B. não tinha a menor ideia de onde E. poderia estar agora, disse ele, mas se conseguisse achar alguém como ela, sabia que não hesitaria em casar outra vez.


Esse foi o fim da conversa. Até mencionar aquela mulher para o amigo, B. não havia pensado nela nenhuma vez ao longo de dez anos, mas agora que ela ressurgira em sua mente, ele não conseguia pensar em mais nada. Durante os três ou quatro dias seguintes, pensou nela constantemente, e não conseguia se desvencilhar do sentimento de que sua única chance de felicidade se perdera muitos anos antes. Então, quase como se a intensidade daqueles pensamentos tivesse mandado um sinal pelo mundo afora, uma noite o telefone tocou e lá estava E. no outro lado da linha.


B. a manteve no telefone por mais de três horas. Mal sabia o que estava dizendo para ela, mas continuou, compreendendo que algo muito importante havia acontecido e que ele não podia deixá-la escapar outra vez.

Depois de se formar na faculdade, E. havia entrado numa compania de dança e os últimos 20 anos se dedicava exclusivamente a sua carreira. Nunca tinha se casado e agora que estava prestes a se aposentar da carreira de dançarina ela estava telefonando para os velhos amigos do passado, tentando refazer contato com o mundo. B. combinou de vê-la na noite seguinte. Quando se encontraram, não demorou para B. descobrir que seus sentimentos por ela eram de fato tão fortes como havia imaginado. Apaixonou-se por ela outra vez e, alguma semanas depois, eles estavam noivos.


Para deixar a história ainda mais perfeita, revelou-se que E. era rica e independente... o que significava não só que B. tinha encontrado o seu verdadeiro amor, mas também que seus opressivos problemas com dinheiro, que o martirizaram durante tantos anos, haviam desaparecido de uma hora para outra.

Um ou dois anos depois do casamento, tiveram um filho. Segundo as últimas informações que tive, pai, mãe e filho passavam muito bem.


Um das histórias "reais" de Paul Auster do livro O Caderno Vermelho.

4 comentários:

Paulo Presotto disse...

Adoro historias com finais felizes

Kaká disse...

Esse comentário veio no meu email, tão bonitinho que postei aqui. Palavras da Bel.

love it!!! é verdade né. o mundo é muito doido mesmo, o plano do cosmos é perfeito sempre, e a gente não tem nunca como prever as voltas que a vida dá... bjo, bel.

Kaká disse...

Eu adoooooooooooro essas histórias... parece q nestas histórias as pessoas têm mais força e mais amor para dar certo... sei lá...

Esse estava no meu email tb... by Claudinha

Marza disse...

Kaka, ele sentiu aquilo q a gente falou em Guarulhos aquele dia: o q precisamos sentir para saber q esta é a pessoa? isso q ele sentiu...