Quem somos

8 de jun. de 2011

120 anos



Fui visitar seu túmulo e fiquei impressionada com a quantidade de beijos e bajulações estampadas no belo muro de pedras. Nunca havia lido nada além de suas famosas frases e seu movimento estético: o belo como antídoto para os horrores da sociedade industrial. Algumas semanas depois em um albergue holândes descontraído, encontro na sala de fumantes e mini biblioteca um volume de 'O Retrato de Dorian Gray' em uma edição bilíngue, obrigada, português e inglês. Não poderia deixar de escorregá-lo para dentro de meu quarto e mais tarde para dentro de minha mochila. Um brasileiro havia esquecido, tenho suas cartas dentro do livro, e um dia pretendo devolvê-lo. Portanto me perdoem se eu repetir tantas vezes trechos do livro nas postagens, mas eles movimentam um tanto de minha imaginação, estampam minha dualidade momentânea e atendem alguns de meus valores sociais...

"Porque influenciar alguém é dar-lhe a sua própria alma. Ele já não tem seus pensamentos naturais ou arde com suas paixões naturais. Suas virtudes não lhe são mais verdadeiras. Seus pecados, se é que há algo como pecados, são emprestados. Ele se torna o eco da música de outro alguém, um ator em um papel que não lhe foi escrito. O objetivo da vida é o autodesenvolvimento. Entender a natureza de alguém perfeitamente - eis o porquê de estarmos aqui. As pessoas temem a si mesmas, hoje em dia. Elas se esqueceram da maior de todas as tarefas, aquela que alguém deve a si mesmo. Claro que são bondosas. Elas alimentam aos famintos e vestem os mendigos. Mas a própria alma delas tem fome e está nua. A coragem se evadiu de nossa raça. Talvez nunca a tivéssemos. O terror da sociedade, que é a base da moral, o terror de Deus, que é o segredo da religião - essas são as duas coisas que nos governam. E, ainda... (...) E, ainda (...) acredito que se um homem fosse viver sua vida intensa e completamente, daria forma a qualquer sentimento, expressão a cada pensamento, realidade a todos os sonhos - acredito que o mundo ganharia tal impulso de alegria que esqueceríamos todas as tristezas do medievalismo e voltaríamos ao ideal helênico - a algo mais fino, mais rico do que o ideal helênico, talvez. Mas o homem mais corajoso entre nós teme a si mesmo. A mutilação do selvagem tem sua trágica sobrevivência na autorrecusa que desfigura nossas vidas. Somos punidos pelas nossas recusas. Cada impulso que lutamos para estrangular remói em nossas mentes e nos envenena. O corpo peca uma vez e se contenta com seu pecado, pois a ação é um modo de purificação. Nada permanece então além da lembrança do prazer ou da luxúria de um remorso. O único modo de se livrar da tentação é ceder a ela. Resista e sua alma cada vez mais adoece com o anseio pelas coisas que ela mesma se proibiu, com o desejo pelo o que suas leis monstruosas tornaram monstruosas e ilegais. Já se disse que os grandes eventos do mundo ocorrem no cérebro. É no cérebro e apenas lá, que os grandes pecados do mundo também ocorrem. Você, Senhor Gray, você mesmo, com sua juventude de rosas vermelhas e sua adolescência de rosas brancas, você teve paixões que lhe deram medo, pensamentos que lhe encheram de terror, delírios e sonhos cuja mera memória poderiam manchar seu rosto de vergonha..."
(O Retrato de Dorian Gray, 1890)

* para fins de devolução do livro, cito o nome de seu dono e quem sabe um dia o Google Search não possa nos unir através de Oscar Wilde. Obrigada, Rodrigo de Lima Horta.

3 comentários:

Kaká disse...

Somos punidos por nossas recusas..
Interessante.. só me basta saber o que eu quero de verdade - de alma - para então não recusar!!

Marza disse...

pois é, se seguíssemos nossos impulsos naturais, estaríamos apenas não recusando o que queremos realmente...mas são tantas as distrações, as regras e as posições...que já nem sabemos mais o que verdadeiramente brota ...será?

Kaká disse...

Acho que é isso mesmo!! Nossos impulsos naturais se perderam nessa mundo de informações e desconexões... talvez por isso a prática meditativa, o yoga. Manter a conexão para que possamos estar em equilíbrio com nossos impulsos verdadeiros..

Eita.. acha vipassana e ashtanga nessa vida