Quem somos

14 de jul. de 2010

Ou Isso ou Aquilo

Por Yuri Vasconcelos

Você já passou pela sensação de se sentir desorientado, perdido, sem saber o que quer da vida? Já viveu a angustiante situação de estar diante de uma escolha e não saber o que fazer? E aquele arrependimento depois de ter feito uma opção? Tomar decisões é difícil, todo mundo sabe. Mas o curioso é que nossos problemas começam muito antes do momento de decidir. Afinal, para fazer uma escolha, precisamos saber o que queremos. E a maioria de nós não sabe dizer o que deseja. Grosso modo, até sabemos que queremos ser felizes, mas não temos uma idéia muito clara de como chegar lá.

Se você tem a sensação de que o mundo está complexo demais para saber o que quer em meio a tanta informação, acertou. É isso mesmo. Atualmente há tantas opções à nossa disposição, que é como se vivêssemos de encruzilhada em encruzilhada, tendo que escolher o tempo todo entre vários caminhos: filhos ou profissão, advocacia ou gastronomia, cidade ou campo, remédio ou homeopatia, sorvete com calda ou iogurte desnatado? No lugar de facilitar as escolhas, essa diversidade de possibilidades, caminhos e modelos acaba dificultando e imobilizando as pessoas.

É claro que é bom ter opção. Sua avó, leitor, provavelmente não teve outra escolha a não ser casar, viver para a família e ter filhos. Hoje, muitas mulheres achariam essa vida um suplício, e é bom que elas tenham outras possibilidades. Mas não dá para negar que essa multiplicidade de caminhos causa ansiedade e, em algumas pessoas, provoca uma angústia paralisante.

O primeiro passo para descobrirmos o que queremos é entendermos que todo ser humano carrega dentro de si um conflito de interesses, uma verdadeira guerra de desejos. De um lado desse combate estão as coisas que você quer mesmo, seus desejos verdadeiros, aqueles que, quando satisfeitos, levam a um estado de espírito conhecido por felicidade. Do outro, estão as coisas que os outros querem para você. Sim, os outros. Muitas vezes queremos e escolhemos algo não porque aquilo está de acordo com o que realmente desejamos, mas por influência de nossos amigos, parentes ou do grupo do qual fazemos parte...

A sociedade também impõe seus quereres, tentando nos enquadrar no estilo de vida que ela (ou seu grupo mais influente) acha que é melhor. Se você parar um minuto para ouvir seu coração, talvez conclua que não quer, de verdade, ser competitivo, vitorioso, bem-sucedido, magro e sarado. No entanto, todo dia você se esfalfa no trabalho para juntar uma grana e poder comprar a roupa da moda, decorar a casa ou botar um carrão na garagem. E no tempo que sobra corre para a academia para queimar as gordurinhas. Pois é. Vivemos numa sociedade capitalista. Aqui é assim...


Bem, mas já que vivemos no capitalismo e não na selva amazônica, vale a pena entender melhor o que andam nos empurrando por aqui. Nas pequenas comunidades, onde todo mundo sabe quem é quem e o que cada um faz e pensa, as pessoas se reconhecem e se aceitam pelo que são. Mas nas grandes cidades, onde se vive cada vez mais isolado e menos íntimo dos outros, isso é impossível. Assim, informamos ao mundo quem somos pelo que possuímos. "Já não somos nós, como pessoa, o foco de identidade, mas as coisas que exibimos: as roupas, o carro, os lugares que freqüentamos, etc. Com isso, toda a referência de reconhecimento e de encontrar nossos pares é dada pela exterioridade do sujeito", diz Lia, da Associação Palas Athena. Isso explica o comportamento do sujeito que gasta o dinheiro que não tem para comprar uma roupa de grife. Quando se deixam levar por esses quereres, as pessoas perdem contato com seus desejos mais íntimos, ou seja, consigo mesmas.

Mas ninguém está dizendo que é errado ganhar dinheiro, ter um bom emprego, um carro novo e uma casa confortável. Tudo isso é saudável. "A questão primordial é não vincular nossa felicidade aos desejos materiais. Podemos ser felizes com ou sem eles...


Seja qual for a origem dos desejos autênticos, o caminho para conhecê-los é um só: autoconhecimento. Afinal, se não nos conhecermos, como podemos saber o que é mais importante para nós mesmos? Como uma boa junguiana, a terapeuta Denise Ramos dá uma explicação holística e poética para descobrirmos o que queremos. "O verdadeiro querer", diz ela, "está associado às realizações pessoais, à expansão do próprio ser e ao desenvolvimento de todo nosso potencial. É isso que leva à felicidade. Ela, a felicidade, não está nos quereres ilusórios, condicionados ou artificiais, mas no contato consigo mesmo. É nesse contato que descobrimos o que nos torna feliz." Bonito, né?


O processo de autoconhecimento não tem fim. Começa ao nascer e termina com a morte. "Aquilo que está dentro de nós, que deseja algo para nós, está sempre em transformação. Se ouvirmos nossa voz interior, vamos seguir o caminho do centro, da totalidade, da criatividade, do fazer pela humanidade", diz Denise. Mas, atenção: não há regras nem receitas mágicas para se conhecer e identificar as próprias vontades. É um processo contínuo e custoso, que exige muita determinação, coragem e perseverança...

Às vezes, só dá para saber o que se quer experimentando, mesmo.


...Contraditoriamente, saber o que se quer não é suficiente para que alguém viva de acordo com os próprios desejos. E o culpado disso é o medo, o medo de abrir mão das opções. Enquanto não escolhemos, todas as opções ficam à disposição. Por outro lado, não podemos usufruir nenhuma delas.

É um fato da vida: toda decisão implica perdas. Afinal, escolher uma coisa significa abrir mão das outras, pelo menos naquele instante. "E a escolha nos angustia porque temos receio de escolher errado e perder a oportunidade de escolher bem".


Revista Vida Simples

Nenhum comentário: